“Você é um millenial!”, diz a amiga, seis anos mais velha. O tom é pejorativo. Outro, quatro anos mais velho, repete a mesma frase, com a mesma entonação. No critério deles, para ser millenial, basta nascer depois de 1990. Eles, idosos dos anos 1980, estão livres da alcunha. E, por sua vez, ganha o conceito pejorativo por ser associada à maior sensibilidade, maior dificuldade em tomar decisões e maior liberdade para fazer mudanças repentinas e drásticas. Millenials são famosos por serem hesitantes e terem uma maior fragilidade perante aos desafios da vida e uma visão mais natural sobre doenças mentais. Então, de acordo com os “críticos” dos millenials, eles também são famosos por terem grandes dificuldades para lidar com autoridades. Isso se daria por serem uma geração extremamente mimada, em que pais chegam ao extremo de acompanhar os filhos em entrevistas de emprego.
O cinema e a televisão, historicamente, sempre tiveram um papel determinador sobre os rumos e definições geracionais. Em 1955, James Dean entregou à sociedade americana mais do que uma atuação lendária, mas uma metáfora de si próprio e da imagem do adolescente que materialmente e imageticamente obtém sucesso dentro de seu universo, mas que para os olhos do resto do mundo adulto, não passa de uma criança perdida. Curiosamente, a imagem do sex symbol no cinema, quase sempre esteve ligada a adolescentes que em muitos casos são menores de idade e, portanto, proibido por lei em países como o próprio EUA de se relacionarem sexualmente com adultos. O materialismo, nesse sentido, supera a questão moral e constitucional. Ironicamente, a famosa cena final de Juventude Transviada acontece no Griffith Observatory, um dos locais mais próximos em Los Angeles para se ver o famigerado letreiro de Hollywood.
Ao longo dos anos 1960 e 1970, diversos filmes interpretaram a temática adolescente ou jovem adulta, muitos deles musicais. A geração da época, eram os Baby Boomers. Aqueles nascidos pós-2ª Guerra Mundial, impulsionados por pacotes de incentivo à economia e ao crescimento populacional norte-americano. Muitos filmes dos anos 1970 retratavam a criativa e inovadora juventude dos anos 1960. “Hair”, “Grease”, “Os Embalos de Sábado a Noite”. Títulos que ilustram o adolescente dos anos 1960 como alguém destemido, focado em sua diversão, recheados de personalidade e extremamente sociais. Seu único ideal, em alguns casos, era se opor à guerra do Vietnam. Os pais, são sempre pintados como obstáculos no caminho dos jovens que só querem desfrutar de suas liberdades. A suas imagens valem ouro. Mas, quando digo imagem, digo imagem de verdade, física, palpável. As jaquetas de couro, os cabelos com brilhantina, os carros descolados. As suas metas eram ter alguém com quem passar a noite e boas histórias. O meio ambiente, o que será do planeta, o que ocorre com minorias étnicas e religiosas, questões de sexualidade e gênero, saúde mental e suicídio, sequer eram tópicos conhecidos por esses jovens.
Nos anos 1980, a coisa começa a mudar de figura. A figura do nerd começa a surgir, junto com a presença de eletrônicos nos filmes. Os protagonistas dos filmes de John Hughes, né Bernardo?, não são atletas superstar, com biotipos perfeitos. A depressão, a solidão, a angústia adolescente começa a ser vista nos filmes. Filmes esses que foram assistidos por nós, os millenials, quando éramos crianças na sessão da tarde. Se adiantarmos um pouco a linha do tempo e chegarmos nos dias de hoje, a comparação fica gritante. No cinema e na literatura infanto juvenil, a morte é a maior companheira de adolescentes. Seja por suicídio ou por câncer. O sofredor de bullying virou protagonista. Em “13 Reasons Why”, além da alarmantemente pertinente questão do suicídio, a falta de traquejo social do protagonista é a linguagem de identificação com grande parte do público. E essa geração, já nem millenial é, mas sim a tal da Geração Z. Se a geração dos millenials ainda se lembra de dividir um computador de monitor enorme entre todos os membros da família, a geração Z pouco usa um computador.
Assim, jovens nascidos no final dos anos 1990 possuem uma relação com imagem completamente única, distante de todas as outras gerações até então. Na telinha de 6 polegadas, o Sex Symbol deu lugar para o Influencer. O que permite que, imageticamente, o sofredor de bullying não precise ter o mesmo apelo que o sex symbol dos anos 1960, 70. O pôster de Grease é o olhar 43, meio de perfil, de John Travolta (que os Millenials fizeram o favor de detestar e jogar na vala comum, fazendo um bullying constante com o célebre ator, desvalorizando toda a sua enorme importância para a cultura popular. Lamentável.). Já o pôster do musical “Dear Evan Hansen”, sequer mostra a cara do protagonista. Apenas o seu braço quebrado. Evan Hansen é invisível, até uma de suas cartas viralizar e todos passarem a admirá-lo – virtualmente. E uma das principais músicas da peça se chama “You Will be Found”, ou “Você será encontrado”, na qual Hansen canta sobre como de alguma forma ou de outra, por mais invisível que você seja, você sempre será encontrado.
Talvez seja verdade. Mas a questão que fica é, ser encontrado virtualmente é ser encontrado de verdade?