Reflections of Clouds on the Water-Lily Pond

O contato com a Arte

Ao visitar algum museu, tenho tentado registrar as reações do público em contato com as pinturas e quadros mais relevantes da nossa cultura. O que faz essas obras encantarem tanto quem as admira?

Já contei em outro post sobre minhas visitas a museus, mas dessa vez vou compartilhar com vocês algo que tenho feito nessas visitas.

Vejam a foto abaixo que tirei em um grande museu:

Mona Lisa
Foto tirada antes da pandemia, em 2017 – © Bernardo Supranzetti – Todos os direitos reservados

Apenas pela foto, pela reação das pessoas, pela quantidade de gente próxima ao limite da obra, conseguem adivinhar qual quadro é esse? Qual pintura merece tantos registros fotográficos com celulares? Qual obra de arte abre tantos sorrisos?

Escrevi sorriso, mesmo? Ah, então deve ser o sorriso mais enigmático da História:

Mona_Lisa_Vidro
© Bernardo Supranzetti – Todos os direitos reservados

No meio da multidão, consegui ficar bem no limite do que é permitido de me aproximar da obra mais célebre da cultura ocidental. Ainda vou escrever sobre a Gioconda, mas por agora, vou lhes contar que alguém conseguiu ficar mais próximo do quadro do que eu nesse dia:

Mona Lisa PCD
© Bernardo Supranzetti – Todos os direitos reservados

O Museu do Louvre permite que PCD e idosos possam se aproximar da Mona Lisa mais do que o público geral, o que é uma iniciativa excelente dada a pequena aglomeração que se forma de frente à obra.

Com certeza a foto anterior foi a melhor que tirei nesse dia (que inclusive era meu aniversário), é muito bonito ver o encantamento no rosto da senhora na cadeira de rodas, apontando para um dos rostos mais famosos do mundo. Também gosto de ver como a senhora da frente que está com um echarpe branco está feliz. Posso garantir a todos, de fato esse é um momento especial.

Nessa mesma fotografia, é possível ver a espessura do vidro que protege o quadro de Leonardo Da Vinci e como ela está protegida. Há uma parede inteira só para a Gioconda e talvez seja esse o motivo pelo o qual tantos falam que este é um quadro pequeno, que se surpreendem pelo tamanho dele.

Em cada ponta dessa parede, há dois seguranças, como é possível perceber na fotografia anterior e também nessa outra:

Mona Lisa Security
© Bernardo Supranzetti – Todos os direitos reservados

Com o sujeito do canto, que estava distraído com algo no momento que tirei a foto, brinquei com ele no meu francês recém aprendido na escola se esse quadro não era o verdadeiro, se não era uma mera cópia que estava em exposição. E sua resposta irritada foi: “e se fosse falso, eu estaria aqui?!?!”.

Apenas o “Código Da Vinci” poderá responder esse questionamento, mas independente de qual obra está por trás do grosso vidro dessa parte do Museu do Louvre, o encantamento que a Mona Lisa passa para qualquer um dos seus visitantes está nesses mistérios que giram entorno desse quadro, na história que ela carrega, na inovação dessa obra do século XVI.

É possível perceber que quando cheguei até o quadro, a sala da Mona Lisa ainda estava vazia, consegui ficar bem perto e não resisti a ficar andando de um lado para o outro para saber se o olhar da Gioconda iria me acompanhar. Desde muito novo, lia nos livros de História que essa pintura de Da Vinci tinha a capacidade de “movimentar” os olhos, que ela permanecia te olhando independentemente da sua posição.

O que posso dizer é que eu olhei a Mona Lisa e ela me olhou de volta. Enxerguei em mim anos e anos de esforço e sacrifício para estar ali, em Paris, naquele momento. Recordei de tudo que já tinha estudado sobre essa obra, de tudo que já havia ouvido falar nela. Percebi em mim que estar no mesmo ambiente que a Gioconda era algo único na vida e que nem todas as pessoas possuem essa oportunidade.

Me emocionei.

O caminho para chegar até esse momento me fez ficar nessa sala por mais de meia hora, tive que continuar a andar para conhecer as outras obras do Museu, mas aquele momento continuou em mim. A Mona Lisa havia me encantado.

O sorriso que de verdade ficou para mim não foi o da Gioconda, mas sim o meu. Escrevendo esse texto, o mesmo sorriso lá de 2017 chega até o meu rosto, todas as memórias e emoções desse dia permanecem vivos em mim.

Assim como tantos fizeram nesse dia, antes dele e depois, no futuro, também tirei uma selfie com uma das italianas mais famosas do mundo. Não para postar no Instagram, não para mostrar para os meu amigos ou para incluir nesse texto. Mas sim para falar para mim mesmo que eu estive lá. Com ela.

Gioconda Selfie
© Bernardo Supranzetti – Todos os direitos reservados

A arte é algo fenomenal. Se não tivéssemos essa admiração por ela, esse site não existiria. E até por isso, temos diversos textos que tratamos sobre isso, sobre os impactos que a arte produz em nós, escritores desse humilde blog e nas pessoas e sociedade.

Porém, como sempre tratamos aqui, o que importa de verdade é o impacto que a arte causa em cada um. Milhões de pessoas visitam a Mona Lisa todos os anos, mas cada um possui uma experiência única com aquela obra.

Em Nova York, também estive com um quadro belíssimo, a “Noite Estrelada” do van Gogh. No MoMA, onde está a pintura, havia um sujeito que estava encantado com essa obra, era de uma felicidade genuína estar ali naquele ambiente e ao virar na única parede do centro da sala e se deparar com aquele quadro, foi só emoção.

Parecia que ele estava fazendo uma espécie de vlog, ou filmando as atrações do museu, mas estar ali era especial para ele, estava para além do ofício que ele estava realizando naquele momento. De forma simples, ele pede para uma fotografá-lo:

Happy
Foto tirada antes da pandemia, em 2017 – © Bernardo Supranzetti – Todos os direitos reservados

Gosto de pensar que, como eu, ele só queria registrar aquele momento para o futuro, para ele mesmo acreditar que estava ali ou até para mostrar para os filhos, netos, que ele um dia esteve junto de um dos mais icônicos quadros de Vincent van Gogh.

Registrar as interações das pessoas com diversas obras me faz refletir sobre o que devemos fazer quando estamos diante de um quadro em um museu. Devemos registra-la? Pegar seus mínimos detalhes?

Edgar Degas
© Bernardo Supranzetti – Todos os direitos reservados

Ou devemos ignora-la? Talvez até pesquisar mais sobre aquela obra, ir além do que nos foi informado?

Louvre Portable
© Bernardo Supranzetti – Todos os direitos reservados

No final das contas, não importa. O que devemos fazer é estar em contato com a arte, saber aquilo que não me interessa e aquilo que eu gosto, que me encanta. Conhecer mais sobre a arte, sobre as obras que estou tomando contado. Mas nada muito acadêmico, porque o importante é pensar sobre aquilo que estou observando.

Por que um Picasso é importante? Mas será que ele diz algo para mim? Eu gosto disso?

A arte existe como forma de expressão do humano, é uma maneira de nos comunicar, de falar por meio de símbolos. Tenho certeza que já coloquei essa citação de Terêncio, dramaturgo grego que viveu por volta do ano 150 a.C., em alguns posts do site, mas para mim, ela define o que é a arte:

Sou humano, nada do que é humano me é estranho

A arte e estar com a arte diz sobre nós mesmos, sobre nós como uma comunidade, nós como indivíduos. Sempre que estamos em contato com arte, poderemos extrair elementos que vão acrescentar, ou não, em nossas vidas. Mas no fim, a arte sempre é sobre o que é humano, não importa a sua forma.

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